Artigos | Postado no dia: 6 novembro, 2024

IMPACTOS TRABALHISTAS PARA AS EMPRESAS NOS CASOS DE LIMBO PREVIDENCIÁRIO

O limbo previdenciário é uma situação complexa que ocorre quando o empregado, após um período de afastamento por doença ou acidente, se encontra em uma condição onde tanto não recebe uma remuneração da empresa, quanto não recebe benefício do INSS. 

Isso pode ocorrer em decorrência de divergências de entendimento entre o INSS e o médico do trabalho e, até mesmo, o próprio empregado, em relação à aptidão para o retorno ao trabalho. 

A Justiça do Trabalho entende que o limbo previdenciário deixa o empregado desamparado financeiramente, e costuma responsabilizar as empresas em tais casos. Ocorre que uma análise cuidadosa dos fundamentos destas decisões demonstra que, em algumas situações, há um excesso na atribuição de responsabilidade aos empregadores.  

Embora seja válida a compreensão de que os trabalhadores devem receber apoio financeiro em momentos de incapacidade laboral, por outro lado, a condenação das empresas de forma quase que “automática”, sem considerar com rigor os elementos específicos do processo, não parece ser uma abordagem equilibrada, poia esse tipo de simplificação na análise jurídica acaba por transferir para a iniciativa privada funções que deveriam ser de responsabilidade da Seguridade Social.  

Por esse motivo, é fundamental que as empresas entendam as suas responsabilidades para evitar problemas com a legislação trabalhista. 

 

  • HIPÓTESES DE LIMBO PREVIDENCIÁRIO E A RESPONSABILIDADE DA EMPRESA EM CADA CASO: 

São inúmeras as hipóteses em que o empregado pode se encontrar em situação de limbo previdenciário, mas iremos listar aqui três dos principais e mais comuns casos, bem como as alternativas possíveis para as empresas: 

 

  1. Alta médica do INSS e recusa do médico do trabalho em autorizar o retorno do empregado: ocorre quando o INSS concede alta ao empregado, considerando-o apto para retornar ao trabalho, mas o médico do trabalho da empresa considera que ele ainda está inapto para desempenhar as suas funções. Nesse caso, o empregado fica sem receber tanto o salário, quanto o benefício previdenciário do INSS. 

Solução: a responsabilidade recai sobre a empresa, que deve buscar soluções para que o empregado não fique desamparado. A empresa pode realocar o funcionário em outra função compatível, se possível, ou ajudar o empregado a obter uma nova perícia junto ao INSS. Se o empregado não pode retornar às funções originais, mas ainda necessita de assistência, a empresa deve oferecer suporte até que a situação seja resolvida, a fim de evitar futuros passivos trabalhistas. 

 

  1. Alta médica do INSS e recusa do empregado em retornar por sentir-se incapacitado para o trabalho: nesse caso, o INSS concede alta ao empregado, mas este, por conta própria, entende que ainda não está apto para retornar às atividades, recusando-se a retomar o trabalho sem uma justificativa médica. Essa situação pode levar o empregado a não receber o benefício do INSS, nem o salário pelo empregador, diante das faltas injustificadas. 

Solução: a responsabilidade da empresa é mais limitada neste caso, uma vez que o próprio empregado se recusa a voltar sem justificativa médica. No entanto, para evitar problemas, a empresa pode orientar o empregado a buscar um novo laudo médico particular que justifique sua incapacidade, e pode colaborar com o processo de reavaliação junto ao INSS. Caso o empregado persista na ausência injustificada, a empresa poderá adotar medidas disciplinares, e até mesmo aplicar a justa causa, caso não haja estabilidade. 

 

  1. Demora na concessão ou extensão do benefício previdenciário por parte do INSS: nesses casos, o empregado fica desamparado financeiramente, pois a empresa não tem a obrigação de pagar o salário após o 15º dia de afastamento, e o INSS também não paga o auxílio. Isso ocorre quando o empregado solicita o benefício ou a sua extensão (por ainda se sentir incapacitado), mas enfrenta morosidade no processo, mantendo-se sem benefício previdenciário e sem salário. 

Solução: a empresa não é obrigada a pagar o salário do empregado após o 15º dia de afastamento. No entanto, a Justiça do Trabalho pode considerar que o empregador tem responsabilidade subsidiária se o empregado permanecer sem meios de subsistência por uma demora excessiva do INSS. Nesse sentido, a empresa pode tomar medidas para auxiliar o empregado na obtenção do benefício e considerar formas temporárias de suporte financeiro, minimizando os impactos para o empregado. 

 

  • E QUAL A RAZÃO PARA A JUSTIÇA DO TRABALHO SEMPRE IMPOR ESSA RESPONSABILIDADE QUASE IRRESTRITA AOS EMPREGADORES? 

 

Por dois fundamentos principiológicos. São eles: 

 

  1. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana:  

A Justiça do Trabalho frequentemente interpreta que, em situações onde o trabalhador fica sem qualquer forma de subsistência por conta de falhas ou demoras administrativas do INSS, o empregador pode ter a responsabilidade de garantir o mínimo de suporte financeiro até que a situação seja resolvida. Essa interpretação se baseia no princípio da dignidade da pessoa humana, assegurando que o trabalhador não fique sem renda por conta de trâmites burocráticos. 

 

  1. Princípio da Continuidade da Relação de Trabalho 

A Justiça do Trabalho entende que o objetivo das partes de uma relação contratual de trabalho é a manutenção do contrato. Mesmo quando a empresa não está mais responsável pelo empregado, durante o período de afastamento previdenciário ou acidentário, o contrato de trabalho continua vigente, estando, porém, apenas suspenso, ou seja, o vínculo empregatício permanece ativo até que o benefício seja concedido ou a situação do trabalhador seja regularizada. 

Por esse motivo, a empresa é quem detém relação contratual e direta com o empregado, possuindo a responsabilidade de ampará-lo em uma situação de fragilidade física e financeira. 

 

  • E QUAIS SÃO AS MEDIDAS QUE AS EMPRESAS PODEM ADOTAR PARA EVITAR ESSA RESPONSABILIZAÇÃO NA JUSTIÇA DO TRABALHO? 

 

Algumas medidas podem ser adotadas pelas empresas para afastar ou, pelo menos, mitigar a sua responsabilidade em eventual reclamação trabalhista ajuizada pelo empregado. 

 

  1. Auxílio ao Empregado para a Solicitação de Benefício Previdenciário 

A empresa pode e deve ajudar o empregado com a solicitação do benefício previdenciário junto ao INSS, especialmente em caso de demora. Esse suporte pode incluir orientações sobre documentos, envio de informações e até intermediação junto ao INSS. 

 

  1. Compensação Direta com os Valores Retroativos do INSS 

Se o INSS conceder o benefício com retroatividade, a empresa pode acordar com o empregado a devolução dos valores antecipados pela empresa, possibilitando a compensação direta. É importante formalizar esse acordo previamente para garantir segurança jurídica. 

 

  1. Desconto em Folhas Futuras 

Caso não haja compensação direta com os valores retroativos, a empresa pode negociar com o empregado o desconto dos valores adiantados em parcelas na folha de pagamento, respeitando os limites legais para que o empregado não seja excessivamente onerado. 

 

  1. Acordo Formal de Antecipação ou Empréstimo sem Juros 

O empregador pode firmar um contrato de antecipação ou empréstimo temporário sem juros, onde fica estabelecido que o empregado devolverá os valores quando receber o benefício do INSS. Essa formalização traz mais segurança jurídica e clareza ao acordo. 

 

  1. Ação Judicial para Recuperação de Valores 

Em situações extremas, onde o INSS falha em conceder o benefício ou demora excessivamente, a empresa pode optar por uma ação judicial regressiva contra o INSS para recuperar os valores adiantados ao empregado. 

 

  1. Negociação Direta com o INSS para Compensação Administrativa 

A empresa pode tentar uma negociação administrativa com o INSS para obter informações sobre o trâmite do benefício do empregado e verificar formas de compensação. Essa abordagem pode facilitar a resolução do caso, especialmente em empresas maiores com frequentes afastamentos de empregadores. 

 

  • EXISTE A POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO DE VALORES PAGOS PELA EMPRESA EM FORMA DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO? 

A resposta é não. A legislação atual não permite que as empresas realizem uma compensação direta dos valores pagos aos empregados por meio de crédito tributário junto ao INSS. Dessa forma, qualquer valor adiantado pela empresa deve ser compensado diretamente com o empregado, seja por meio de devolução, desconto em folha de pagamento ou acordo formal de antecipação. 

 

CONCLUSÃO 

No ordenamento jurídico brasileiro não existe uma norma específica que trate da questão do limbo previdenciário, o que gera uma sensação de incerteza tanto para os trabalhadores com incapacidade temporária quanto para seus empregadores. A dúvida que fica é: quem deve arcar com o custo financeiro do período de afastamento que não é coberto pelo benefício previdenciário? 

O certo é que é plenamente possível evitar prejuízos e conflitos jurídicos desnecessários com uma gestão assertiva de limbo previdenciário, e uma boa consultoria para ajudar as empresas a evitarem o surgimento destes casos é a solução. 

 

JOHN ALBERT BRITO DINIZ 

OAB/MA 21.381